sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Carência

Desceu a rua despreocupadamente. Antes, talvez, estivesse distraído. Se perguntassem, não saberia dizer o que pensava naquele momento. Seguia. Talvez estivesse anestesiado por tudo o que ocorrera na véspera. Anos vivera dum jeito que não o deixava contente. "Felicidade?", perguntavam, perguntava respondendo. Não, não acreditava que a tal da felicidade pudesse existir. "Bobagem!"

Adiante viu um casal de namorados, tão próximos, colados, parecendo um só. "Um só..." Era isto que lhe haviam ensinado, ser um só com o seu par. E lhe falaram em mulher ideal, em cara metade, em alma gêmea, e se esqueceram de falar da solidão. Ninguém nunca lhe havia falado em solidão. Era assunto proibido. Parecia mesmo que a tal solidão não existia. E existia!

O casal apaixonado o fez sentir-se carente. "Carência!", quase falou alto, mas conteve-se. Era isso, então. Por causa da carência, do medo da solidão, havia se submetido a uma relação que não poderia continuar. Esquecera-se de viver a sua própria vida. Vivera a vida de outro alguém, mas que também não era a vida desse alguém, a não ser uma suposição, um achar que "era pra ser assim", pois assim lhe haviam ensinado.

O casal apaixonado agora discutia. "Mas o que diabos há com eles?" Ele também já fizera isso. Ah, a vida! Tão contraditória, tão cheia de medos. O que o deixava aliviado, é que agora se sentia livre, e achava que ela devia estar pensando o mesmo. Se não, um dia pensaria.
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Um comentário:

Anônimo disse...

Legal, Hobold! Deu pra lembrar ditos, como: "achar alguém que te complete" (sendo que já somos completos!).
Abração.